terça-feira, 21 de setembro de 2010

Classe média soma 50% da população e domina poder de compra, diz FGV

10/09/2010 - 18h15

Classe média soma 50% da população e domina poder de compra, diz FGV

VERENA FORNETTI
DO RIO

Pela primeira vez, a classe média do Brasil atingiu 50% da população. O cálculo é do economista Marcelo Neri, da Fundação Getulio Vargas, com base em dados da Pnad 2009 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
No ano anterior, a classe C representava 49,2% da população e, em 1992, 32,5%. A FGV enquadra nesse estrato as famílias com rendas domiciliar de R$ 1.116 a R$ 4.854. Essa nova classe média abarca 94,9 milhões de pessoas, segundo a FGV.
'A classe C agora é dominante em poder de compra. É ela que vai comandar o país não só economicamente, mas também em termos políticos', diz o economista.
Para ele, há uma 'revolução silenciosa' no país. Depois do Plano Real e da estabililização da economia, houve um aumento do bem-estar da população.
Principalmente a partir da década de 1990, a escolaridade avançou e o tamanho das famílias diminuiu. Nos anos 2000, o emprego formal registrou sucessivos recordes e a renda média individual cresceu com mais ímpeto.
'No Brasil sempre fomos mais cigarras que formigas, entendendo formiga como aquela que pensa no futuro. Está havendo uma transformação. Estamos caminhando para ser mais formigas.'
DESIGUALDADE
Neri afirma que, mais que o consumo, é o trabalho que avança no Brasil. 'O que está prosperando é o do trabalhador brasileiro, mais que o consumidor brasileiro. Ele não só está comprando mais como vai poder comprar mais lá na frente.'
Para ele, o 'boom brasileiro' é de melhor qualidade que o chinês, pois vem acompanhado de maior equidade. 'A China vive uma crescente desigualdade, similar à que vivemos durante o milagre econômico brasileiro dos anos 60, bem detalhado no livro seminal de Carlos Langoni'.
O economista destaca que a desigualdade social vem caindo durante toda esta década.
Segundo ele, o país caminha para registrar o menor nível de desigualdade desde a década de 1960.
Nesses anos, o índice de Gini --principal indicador para auferir a desigualdade social-- era de 0,5367. O índice varia de 0 a 1: quanto mais próximo de 1, maior é a desigualdade. A partir de 1970, ainda no milagre econômico brasileiro, a desigualdade aumentou. Então, vigorava a ideia oficial de que era preciso fazer o bolo da economia crescer para só depois dividi-lo.
Na década de 1990, em razão da instabilidade econômica e da inflação, o índice de Gini atingiu 0,6091. A partir do Plano Real, segundo Neri, houve um aumento do bem-estar da população e, nesta década, a desigualdade caiu com mais ímpeto.
CLASSE AB ELEIÇÕES
Com base na PME (Pesquisa Mensal do Emprego), também do IBGE, Neri afirma que neste ano a renda da classe AB se acelerou.
Em julho deste ano, segundo ele, o crescimento da renda média dessas famílias é de 13% se comparada à de julho de 2009.
Para todas as classes, o crescimento é de 7,7% na mesma base de comparação.
De acordo com o economista, a tendência é que no futuro sejam as classes AB que registrem as maiores expansões. 'Isso é uma consequência do desenvolvimento do país.'
'O Brasil apresentou crescimento chinês para os mais pobres (e só para eles) entre 2001 e 2004. Mas, no biênio 2005-06, o crescimento chinês ocorreu para todos os estratos sociais', disse Neri.
Nos outros anos, diz Neri, o crescimento da renda para os estratos mais elevados foi menos acelerado. Mas mesmo assim é expressivo.
A classe A cresceu 41% entre 2003 e 2009 e a B registrou expansão de 39%.
MELHORIA
O economista Claudio Dedecca, da Unicamp, diz que é a primeira vez em décadas que o país vive uma queda da desigualdade em um contexto de recuperação da atividade econômica, de estabilidade e controle da inflação.
Embora o índice de Gini tenha melhorado no passado, Dedecca afirma que isso ocorria em contexto menos favorável, com perda do nível de emprego.
'Ademais, [a queda da desigualdade] vem perdurando durante todos os anos da década, mostrando duração significativamente mais longa que a observada para as quedas da desigualdade ocorridas nos anos 80 e 90.'
O economista destaca que, nas décadas anteriores, a redução do índice de Gini não se refletiu, no primeiro momento, em alta do rendimento médio individual.
'A queda da desigualdade com redução do rendimento médio sinaliza que ao mesmo tempo em que os rendimentos dos estratos inferiores apresentaram trajetória ascendente, se observou estabilidade ou queda dos rendimentos dos estratos superiores', afirma ele.
Segundo ele, essa é uma 'fragilidade' da redução da desigualdade no país. Ele aponta outra: a diferença entre a renda obtida por meio do trabalho e a renda obtida pelos que detêm capital --como imóveis e aplicações financeiras-- continua alta.
'A queda da desigualdade não deverá produzir uma alteração do padrão de bem-estar da sociedade brasileira, mas somente atenuará a perversidade que a distribuição de renda do país carrega.'
O pesquisador diz ainda que a redução da desigualdades mas sem que tenha havida a contrapartida do aumento da renda individual --fenômeno que ocorreu até 2006, segundo ele-- provocou uma deterioração do padrão médio de bem-estar.
Mas, a partir daquele ano, a renda média individual também aumenta. 'Então o passamos a um movimento de queda da desigualdade com elevação do bem-estar, decorrentes de incrementos para todos os níveis de renda, com intensidade mais expressiva para os rendimentos mais baixos.'
'Nos últimos anos de dados da PNAD se vislumbra a possibilidade de romper esta limitação que caracteriza a redução da desigualdade, em especial da observada para a renda do trabalho.'
Para o pesquisador, a melhora na desigualdade ocorreu, sobretudo, em razão da política de valorização do salário mínimo, das negociações positivas entre sindicatos e empresas depois da retomada do crescimento.
Ele cita também o Bolsa Família e o aumento do poder de barganha dos indivíduos --que tem mais condições de exigir benefícios e postos melhores quando a economia está bem. 

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